Todo Dia a Mesma Noite Resenha
- Vinicius Monteiro
- 18 de mai. de 2023
- 3 min de leitura
Atualizado: 4 de abr.
★★★★★
Ao reconstituir de maneira sensível e inédita os acontecimentos da madrugada de 27 de janeiro de 2013, quando a cidade de Santa Maria perdeu de uma só vez 242 vidas, Daniela Arbex constrói uma obra que homenageia as vítimas e dá voz aos envolvidos em um dos episódios mais estarrecedores da história do país.
Daniela Arbex já estava no meu radar, pois ela é a autora do famoso 'O Holocausto Brasileiro', um livro que não li, mas tenho muita vontade de ler. Nunca li nada da autora, por isso fico muito feliz de conferir seu trabalho através de 'Todo Dia a Mesma Noite'.
O livro tem uma escrita que parece misturar a narrativa ficcional com uma escrita jornalística. Eu gostei demais da escrita de Daniela Arbex, pois os fatos reais são escritos de uma forma que eu fiquei informado do acontecido, mas também é também sentindo a dor que essa tragédia causou.
O livro me fez entender que o acontecido da madrugada de 27 de Janeiro de 2013, está longe de ser um acidente. O livro aponta as irregularidades da boate (que muita vezes, foi fechada por conta dessas irregularidades), o uso errado das espumas de isolamento, a superlotação de pessoas no local, saídas de emergência insuficiente e muitos erros na construção do local, como barras de ferro para ajudar na fila de entrada, porém todas elas instaladas exatamente na frente da única saída que tinha, um dos motivos que fez os jovens se acumularem um por cima dos outros ao tentar fugir do local, o que só fez aumentar o número de vítimas.
O fogo está longe de ser o único problema da tragédia. Muitos dos frequentadores da boate foram envenenados pelo monóxido de carbono, mesmo gás usado nas câmaras de gás em Auschwitz, a maioria dos corpos foram achados dentro do banheiro da boate. Alguns jovens morreram ao tentar ajudar as vítimas, entrando na boate novamente sem saber do perigo do envenenamento através da fumaça, profissionais que ajudaram no resgate também tiveram problemas de saúde.
A leitura de 'Todo Dia a Mesma Noite' não foi uma leitura fácil. Eu me peguei chorando em vários momentos e sentindo raiva em outros, o livro retrata tudo de uma maneira muito crua, o que deixa a leitura bem dolorosa. O livro imediatamente me fez sair da passividade sobre o caso, e me fez sentir empatia pelos jovens assassinados.
Há um ponto extremamente positivo que eu achei sobre o livro, a história é contada por diversos pontos de vista. Acompanhamos a história do médico que ajudou no atendimento dos jovens que morriam depois de chegarem ao hospital. Da mãe que saiu da sua cidade para procurar desesperadamente sua filha em dezenas de lugares. De muitos profissionais que simplesmente não tinham estruturas para lidar com aquela situação, mas tinham que fazer os seus trabalhos mesmo assim. Pastores evangélicos falando bosta para pais que acabaram de perder seu filho.
'Todo Dia a Mesma Noite' apresenta uma dimensão enorme desse assassinato em massa. As inúmeras histórias, dos profissionais, dos pais e dos sobreviventes só mostram o quão em vão esse jovens morreram, o livro com certeza coloca sua humanidade à prova.
Mais uma vez eu elogio a escrita de Daniela Arbex, em nenhum momento a autora trata essa história de forma sensacionalista, há muito respeito pelas dores causadas. A jornalista soube humanizar muito bem os depoimentos, a minha relação de leitor com os entrevistados é de muito empatia e amor, essa relação é fruto de uma trabalho extraordinário.
A obra tem menos de 300 páginas, ela é curta, mas arrebatadora. Não foi possível ler esse livro de uma vez. Com muitos detalhes, o livro reúne relatos cruéis, tristes e agonizantes, eu tive que parar para tomar um pouco de fôlego e depois avançar na história. As consequências daquela noite ainda estão vivas na memória de uma cidade inteira, o Brasil também não deve se esquecer.
Daniela Arbex soube apresentar a tragédia de forma excepcional. É possível sentir a dor de cada experiência contada, mas é o sentimento de força que me arrebatou após o término da leitura de 'Todo Dia a Mesma Noite'.
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